(...)
O Centro de Estudos de Comunicação e Sociedade (CECS), da Universidade do
Minho, é uma unidade de investigação em Ciências da Comunicação, avaliada pelos
peritos internacionais da FCT (Fundação para a Ciência e Tecnologia) como
Excelente, de resto a única na sua área a obter tal classificação. Trabalham neste
centro 60 investigadores doutorados e cerca de 130 investigadores fazem o
doutoramento. Por outro lado, uma dúzia de bolseiros apoiam os projetos de
investigação em curso. Mas em apenas dois anos, a FCT reduziu o melhor centro
de estudos em Ciências da Comunicação do país a uma unidade de investigação
residual. Cortou-lhe 30% do financiamento global, não aprovou projetos
avaliados como excelentes e reduziu incrivelmente o número de bolsas para
formação avançada. Em 2013, o CECS teve apenas uma bolsa de doutoramento
aprovada, um projeto aprovado em 2012 e nenhum no concurso de 2013.
Por
outro lado, também em 2012, a área de Ciências da Comunicação perdeu a sua
qualidade de área específica, tendo sido colocada no único bloco constituído
das CSH (Ciências Sociais e Humanas), o qual, com os seus 15% de peso no
financiamento, inclui, além das Ciências da Comunicação, a Sociologia, a
História, a Geografia, a Antropologia, as Línguas e Literaturas, os Estudos
Culturais, as Ciências da Educação, as Artes, entre outros. A FCT abriu em 2012
e 2013 concursos de investigadores-FCT, para bolsas de topo na investigação. Os
cinco candidatos do CECS foram reprovados, como aliás todas as candidaturas
nacionais vindas da área das Ciências da Comunicação. Em ambos os concursos,
todavia, nenhum membro do júri era investigador desta área científica. (...)
A
FCT rompeu o pacto de confiança que tinha com as universidades públicas – elas
não são mais o seu parceiro privilegiado para a execução das políticas
científicas. Entretanto, num galope sempre cada vez mais alucinante e
vertiginoso, a irracionalidade seguiu impante. Concursos estruturantes para a
vida das instituições nos próximos seis anos, a serem abertos nas férias de Verão
ou a serem lacrados na passagem do ano. Concursos sem regras fixas, ou com
regras de geometria variável, a serem fixadas em andamento, e até depois de
concluídos os concursos, ou então, pasme-se, a serem alteradas no meio de
concursos abertos. Plataformas informáticas que nunca funcionam de modo
escorreito e tornam caótica a gestão dos prazos dos concursos. A aplicação de
métricas à produtividade científica nas CSH, completamente inadequadas, que
fazem depender a qualidade académica de meras agências de rating. A nomeação de
um Conselho Científico de Ciências Sociais e Humanidades, sem consulta à
comunidade académica e com a credibilidade ferida por uma série de intrusos,
desqualificados na área, uns, com o estigma da encomenda partidária, outros, e
com o vício do nepotismo, outros ainda, um Conselho diminuído em “autonomia,
autoridade e experiência”, a ponto de seis das principais associações
científicas desta área terem exigido, sem mais, a revogação da decisão de
nomeação.
Esta
estratégia, de tão feroz e ensandecida, apenas pode ter como objetivo destruir
a comunidade académica, vencendo-a pelo cansaço, pelo nojo e pelo desespero, na
presunção de que seja impossível suster tamanho ciclone. E, todavia, instados a
pronunciar-se sobre o CECS, o inglês Denis McQuail, professor da Universidade
de Amesterdão e uma referência mundial nas Ciências da Comunicação, e também a
inglesa Annebelle Sreberny e a estadunidense Janet Wasko, respetivamente, a
antiga e a atual presidentes da mais importante associação mundial de Ciências
da Comunicação, a International Association for Media e Communication Research
(IAMCR), escreveram, em síntese:
“O
CECS é o mais reputado centro de pesquisa português em várias áreas, que
incluem a literacia mediática, a economia política dos média, a regulação dos
média, os estudos lusófonos (políticas da língua, políticas da comunicação,
identidade e narrativas, identidade e multiculturalismo), e estudos sobre as
políticas científicas e tecnológicas no espaço ibero-americano. Além disso, o
CECS desempenha um papel de liderança crítica nos estudos da Comunicação. Os
seus membros detêm posições de topo em associações internacionais e na direção
de alguns bem-conhecidos grupos de pesquisa internacional. O centro organizou,
por outro lado, alguns dos mais importantes congressos internacionais de
Comunicação: o Congresso da IAMCR; em 2010, vários Congressos Lusófonos, desde
1999; o Congresso da Secção de Rádio da ECREA, em 2012; o Congresso Europeu de
Semiótica Visual da IAVS, em 2011”. (...)
Deveria
ser permitido puxar da pistola, quando do Governo ou da FCT nos viessem falar
de qualidade e de excelência, de ligação às empresas, de empreendedorismo, de
competitividade e de produtividade. Porque é criminosa uma política científica
que não tem pensamento nem cultura, que não tem conhecimento nem consciência. Um
vento maligno levantou-se na Cidade e percorre-a em devastação. Enquanto durar,
serão anos de calamidade.
Moisés
Lemos Martins, diretor do Centro de Estudos de Comunicação e Sociedade (CECS)
da Universidade do Minho e Presidente da Associação Portuguesa de Ciências da
Comunicação (Sopcom) e da Confederação Ibero-americana das Associações
Científicas e Académicas de Comunicação (Confibercom), “Público”, 03-02-2014 ::
Texto integral: http://bit.ly/1eso9XO :: Fotografia: "Público" / Arquivo
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