O “Daily
Mirror” é lido pelas pessoas que acham que mandam no país. O “The Guardian” é
lido pelas pessoas que acham que deviam ser elas a mandar no país. O “The Times”
é lido pelas pessoas que realmente mandam no país. O “Daily Mail” é lido pelas
mulheres dos homens que mandam no país. O “Financial Times” é lido pelas
pessoas que são donas do país. O “Morning Star” – jornal do Partido Comunist – é
lido pelas pessoas que acham que o país devia ser mandado por outro país. E o “Daily
Telegraph” é lido pelos que acham que ele é realmente mandado por outro país.
É um
exercício interessante, não é? Eu podia aqui exercitar os sucos gástricos e
escrever sobre os concorrentes do “Diário de Notícias” ou até sobre o próprio “Diário
de Notícias”... Há tanto para dizer sobre os jornais. Os jornais do poder
político, os dos juízes e da polícia, os jornais dos empresários e dos
intelectuais (ainda há jornais de intelectuais?), os dos professores e
pensionistas, etc. Não há mal nenhum nisto se entendermos que cada periódico
tem uma clientela com exigências e apetites informativos que criam mercados de
leitura muito concretos.
Há até espaço
para nichos. O “Diário Económico”, onde trabalhei, e o “Jornal de Negócios”,
por exemplo, vendem hoje cada um deles (nem sempre foi assim) menos de quatro
mil exemplares por dia em banca, mas exercem uma influência determinante nestes
poucos leitores que, por sua vez, têm um peso enorme na opinião que o País
forma sobre os assuntos económicos e políticos. Não é por acaso que a reforma
do IRC foi tão bem recebida: a agenda dos empresários é esta, não outra. Já a
redução do IRS (vital) não encontra defensores tão persistentes e vocais que
obriguem a que o assunto se fixe no centro do debate. Os sindicatos poderiam
assumir este papel, mas concentram-se nas reivindicações salariais e na defesa
de estatutos profissionais muitas vezes caducos – e daí não arredam pé.
Na verdade o
que parece escassear são jornais que olhem para o todo e escolham o relevante.
Que tratem as notícias não na perspetiva de um grupo de interesses, mas que
estejam abertos a todo o universo informativo sem ficarem, digamos, capturados.
Não se trata apenas de resumir tudo ao antagonismo superficial entre
austeridade e crescimento, mas de enriquecer as análises e as decisões que
tomamos – como a eleição de um Governo –, com informação bem investigada capaz
de remeter o ruído partidário (a insistência nos swaps) ou o jornalismo mirone
(o biquíni de Judite Sousa) para o lugar que merecem. À “Caras”, portanto, o
que é da “Caras”. A questão é até simples, como diria sir Humphrey, o
secretário permanente do primeiro-ministro Jim Hacker – da série Yes,
Prime-minister, de onde tirei a citação inicial: "Se as pessoas não sabem
o que estamos a fazer no Governo, não sabem o que estamos a fazer mal no Governo."
Não está mal visto.
Autor:
André Macedo, jornalista, “Diário de Notícias”, 15-08-2013
http://migre.me/fKNeO
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