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segunda-feira, 13 de janeiro de 2014

François Hollande em maus lençóis


Quando os assuntos privados colidem com a imagem pública de um político e entram no espaço público deixam de ser assuntos privados para se transformarem em assuntos públicos. Logo, do interesse de todos. Depois, tudo depende da estratégia de comunicação. Mas há casos em que não há estratégia de comunicação que resista. A traição conjugal é um deles. É por isso que o Presidente da França, o socialista François Hollande  que nesta terça-feira terá 600 jornalistas pela frente , se encontra em muito maus lençóis. Na imagem, Hollande e a companheira oficial dos últimos anos, a jornalista Valérie Trierweiler, hospitalizada por causa de uma depressão na sequência deste caso que está a abalar a política francesa. Confira: http://bit.ly/1iHAyb2.

quarta-feira, 9 de maio de 2012

Tarso Genro. Contra o poder neoliberal, marchar, marchar...


Tarso Genro, figura de referência do Partido dos Trabalhadores (PT), força política que lidera a coligação governamental brasileira de Dilma Roussef, aponta o dedo ao capital financeiro globalizado, responsabilizando-o pela grave crise que afecta a Europa, por ter capturado os Estados e os partidos políticos, deixando-os prisioneiros das dívidas públicas. Diz que a austeridade não resolve a crise e considera que o Banco Central Europeu deveria financiar os Estados e as empresas e não os bancos.
Em entrevista ao “Público”, conduzida pelos jornalistas São José Almeida e Nuno Pacheco, Tarso Genro, que esteve na génese dos Fóruns Sociais Mundiais de Porto Alegre, foi ministro com Lula e refundou o PT depois do escândalo do “Mensalão”, sendo considerado um dos ideólogos da esquerda contemporânea, aponta também um caminho muito claro: os Estados têm de recuperar a sua força na produção de políticas públicas. No fundo, é preciso “substituir a utopia socialista do século passado pela utopia democrática altamente politizada”. Deixo aqui as linhas essenciais de um pensamento que considero iluminante.

“Todos estamos imersos num processo de globalização organizada pelo capital financeiro articulado mundialmente, que nos faz padecer de problemas análogos [no Brasil]. A nossa experiência de fazer o contraponto a esta dominação global é sair da crise crescendo, gerando empregos, fazendo uma transição da sociedade de baixo para cima com fortes instrumentos de inclusão social e educacional. A experiência brasileira diz-nos que adoptar a receita de recessão, de desemprego e de redução das funções públicas do Estado não é boa. Causa descoesão social, radicaliza a luta de interesses na sociedade, sectariza as lutas políticas e gera desconfiança da cidadania em relação à esfera da política e isso pode comprometer as instituições democráticas a médio e longo prazo.”

“Uma crise como a da Europa influi no Brasil. O que devemos é produzir bloqueios a esse contágio. Temos especificidades que podem formar um bloqueio forte. Temos um mercado interno em ascensão, que pode ser expandido por dez ou vinte anos. Temos riquezas naturais invejáveis e temos a possibilidade de combinar um modelo de desenvolvimento tradicional, originário da revolução industrial, do desenvolvimento clássico, com um desenvolvimento de ponta, de alta qualificação tecnológica. E temos organizações estatais muito fortes para organizar esse processo, como o Banco Nacional de Desenvolvimento, a Petrobras, o Banco do Brasil, a Caixa Económica Federal. O Estado brasileiro não foi depenado da sua capacidade de produção de políticas públicas. Isso dá-nos uma vantagem comparativa muito grande. E sabemos que não podemos apressar, que não podemos crescer 10% ao ano, não temos infra-estrutura que resista a isso. Podemos crescer 4 ou 5 % ao ano, sem surtos inflacionários e sem arriscar o processo de coesão social, que foi iniciado com o Presidente Lula.”

“A ideologia, a cultura e o modo de vida neoliberal constituem uma espécie de casca de uma sucessão de factos objectivos no desenvolvimento capitalista que teve duas consequências graves. A primeira é que o capital financeiro capturou os Estados e exerce uma força normativa brutal sobre os Estados, através do controlo que o capital financeiro tem das suas dívidas. Isto vem diminuindo a força normativa das Constituições e aumentando a do capital financeiro, obrigando que os Estados se organizem a partir do critério fundamental do pagamento da dívida. [A segunda] é que o projecto neoliberal produziu uma reorganização na estrutura de classes da sociedade, provocando uma espécie de fragmentação social muito maior do que acontecia no contrato social-democrático. Aí os sujeitos eram visíveis, eram as organizações sindicais das classes trabalhadoras, particularmente da classe operária, e as associações industriais que contratavam pactos sucessivos de desenvolvimento e de protecção social. Hojem, os trabalhadores e os partidos perguntam-se: quem são os sujeitos do contrato político e social actual? É o Banco Europeu? É a senhora Merkel como uma espécie de supervisora da União Europeia?”

“Um projecto alternativo tem de ser obra dos partidos políticos, que têm que se renovar e compreender que um programa para a esquerda tem que ser mundial. E, na minha opinião, baseado em dois pilares. A colocação, de novo, no centro, de uma visão de esquerda, da questão democrática, que está em risco na crise do projecto neoliberal. E tem que ser um projecto que aponte de maneira unitária para a recuperação das funções públicas do Estado. E isso significa retirá-lo da tutela do capital financeiro globalizado. Se isso não for feito, toda a política posterior a processos eleitorais irá conciliar com essa força normativa e nunca poderá aplicar o seu programa. Não é de graça que nós vimos sucessivos Governos de esquerda e sociais-democratas, com excepções na América Latina, a irem para o Governo e aplicarem as mesmas receitas do projecto neoliberal. O poder político que o capital financeiro exerce sobre os partidos, os bancos nacionais, os Estados, é incontornável.”

“O Banco Central Europeu poderia financiar as empresas e os Estados e não os bancos. Seria uma mudança extremamente importante. O financiamento aos países em crise devia ser canalizado para reorganizar a base produtiva.”

“Assim como o capital financeiro organizado capturou os Estados ele capturou também os partidos. Os partidos tornaram-se menos centros dirigentes e elaboradores de estratégias e mais passadores do pragmatismo necessário à sua sobrevivência. Não é uma questão de “maldade” dos partidos, é a força coerciva que é exercida pelo capital financeiro que vem destruindo a política – a política tem sido subsumida pela força do capital financeiro. E para que isso seja recuperado o primeiroa cto é um acto de consciência. Recorrendo a uma metáfora: temos de substituir a utopia socialista do século passado pela utopia democrática altamente politizada. E fazer com que os Governos e os partidos se possam comprometer com programas e cumpri-los. As boas construções sociais que o modelo social Europeu fez foi a partir de visões políticas.”


“Tenho sempre muita atenção com o centro democrático porque a nossa expriência no Brasil – e a actual situação europeia também coloca isso – é que é impossível fazer um Governo de mudança sem estabelecer um contrato político com o centro democrático que tem uma grande influência nos sectores médios da sociedade, que pode ser atraído para um projecto democrata, progressista  e que não seja a dogmática neoliberal. Eu ganhei a eleição na primeira volta pelo PT contra os socialistas e os comunistas e chamei os partidos de centro e de centro-esquerda para governar comigo, fiz uma coligação. Aqui em Portugal, por exemplo, estranhei que no 1º de Maio houvesse duas manifestações, uma da CGTP outra da UGT. Sem querer dar opinião e respeitando os partidos – até já conversei com o Presidente Cavaco Silva, que respeito –, pergunto-me se não era de os partidos do centro democrático e da esquerda e o Partido Comunista fazerem um acordo de meia dúzia de pontos para tirar o País da crise e da órbita da tutela normativa do banco central alemão... Esse acordo não iria valorizar a democracia e a república em Portugal?”

Tarso Genro, Governador do Estado do Rio Grande do Sul (Brasil), “Público”, 06-05-2012

domingo, 6 de maio de 2012

Família de Manolo Vidal censura médico da Cruz Vermelha


A família do antigo atleta e dirigente do Sporting Clube de Portugal Manolo Vidal, de 82 anos, condena o médico do Hospital da Cruz Vermelha Portuguesa que publicou no Facebook uma foto do antigo dirigente leonino doente na cama do hospital e quer que a fotografia seja “retirada imediatamente”. A situação foi revelada pelo blogue COMUNICAÇÃO INTEGRADA (ver aqui).
Na altura escrevi que não acreditava que tivesse havido consentimento de Manolo Vidal ou da família para que um doente com aspecto de moribundo fosse exposto como foi na página pessoal do médico. E mesmo com autorização, um médico não pode expor publicamente os seus doentes.
A verdade é que a fotografia chocou muita gente. Outras pessoas, sem questionarem a situação e movidas apenas pelo espírito solidário com a figura de Manolo Vidal, decidiram partilhar a fotografia. A verdade é que a imagem polémica está hoje em vários perfis nas redes sociais e em vários computadores pessoais. Foram feitas perto de 80 partilhas directas, a partir da página do médico no Facebook, e pelo menos, outras tantas repartilhas. Manolo Vidal foi mostrado com ar de sofrimento a todo o tipo de gente: amigos e conhecidos, mas também a eventuais inimigos e desconhecidos. Ou seja, a sua privacidade foi totalmente violada num momento de fragilidade física e psicológica. Ora, nenhum doente pode ser vítima de um caso destes. Doravante, se houver divulgação em blogues e sites, a imagem de Manolo Vidal que irá aparecer nos motores de pesquisa da Internet poderá ser a fotografia que o mostra doente ao lado de um médico com ar sorridente.
O caso chegou ao conhecimento da família de Manolo Vidal, que reagiu indignada. Victor Ollero, o seu filho mais novo, a residir em Espanha, teve conhecimento da divulgação abusiva da imagem do pai através do blogue COMUNICAÇÃO INTEGRADA, onde, num comentário já publicado, agradece “em nome da família ao Sr. Luís Paulo por ter feito esta denúncia”. E, “aos verdadeiros amigos e sportinguistas”, anuncia que já foram tomadas “as medidas para que este pseudomédico, se assim se lhe pode chamar, não volte a repetir com outros doentes o que fez com meu pai”. Por isso, solicita que a fotografia em causa seja “retirada imediatamente”, esperando que Manolo Vidal “ganhe este grande desafio e se recupere o mais depressa possível”.
Num e-mail que me enviou, Victor Ollero escreveu o seguinte:
“Meu caro amigo, sou um dos filhos de Manolo Vidal, o mais novo. Acabo de fazer um comentário no seu blogue, que espero que permita que seja visto. E aproveito para lhe agradecer, em meu nome e em nome da minha família, ter feito essa denúncia sobre esse ‘doctor’. Estaremos-lhe sempre agradecidos. E também dizer-lhe que eu vivo em Espanha, mas gostaria de ter o seu número de telefone para, na próxima vez que eu vá a Lisboa, eu poder entrar em contacto com o senhor Luís Paulo Rodrigues e agradecer-lhe pessoalmente. (…) Um grande abraço!”
Agradeço as palavras e o reconhecimento dos familiares de Manolo Vidal pela acção do blogue COMUNICAÇÃO INTEGRADA perante este caso. E espero que Manolo Vidal recupere do problema de saúde que o afecta.
Como editor de um blogue sobre comunicação, sinto que cumpri o meu dever. Fiz a análise de um caso que considerei pertinente trazer a público, por não ter dúvidas de que estava em causa um médico vaidoso que em vez de tratar da saúde do seu doente apenas cuidou do seu ego, violando a privacidade de Manolo Vidal e o seu direito à imagem. Espero que este caso sirva de exemplo para outros médicos e para outras famílias.
Este caso diz-nos também que as redes sociais não são brincadeira de miúdos. Uma fotografia no Facebook ou em outra rede social qualquer espalha-se muito rapidamente. O impacto é igual ou maior ao da publicação num jornal. Uma página no Facebook é um espaço público mediático como um jornal ou uma revista.

quinta-feira, 3 de maio de 2012

Manolo Vidal está muito doente. Vi no Facebook...


Nesta quarta-feira recebi uma notícia que me deixou triste: Manolo Vidal, antigo jogador e dirigente do meu Sporting Clube de Portugal, que foi responsável pelo futebol de Alvalade quando o clube foi campeão nacional, em 1980 e 2000, está a lutar pela vida no Hospital da Cruz Vermelha, em Lisboa. Igualmente triste foi o meio como soube dessa notícia: uma pessoa amiga enviou-me um “e-mail” para manifestar a sua indignação pelo facto de um médico do Hospital da Cruz Vermelha Portuguesa ter utilizado a sua página pessoal no Facebook para se mostrar ao mundo, sorridente, ao lado de um doente com aspecto de moribundo, numa cama do hospital, precisamente Manolo Vidal. Um caso grave e vergonhoso, porque demonstra uma enorme insensibilidade em relação a uma pessoa doente, que vê a sua privacidade violada de forma assustadora, dentro de um hospital.
Não acredito que Manolo Vidal, de 82 anos, tenha dado autorização para ser exposto desta maneira no Facebook, nem ele estaria em condições de dar essa autorização, dada a situação de debilidade em que se encontra. Assim como não acredito que o médico em causa, João Franklin Gonçalves, tenha agido por mal, pois, ao revelar-se amigo dele, deve ser dos primeiros a querer que Manolo Vidal recupere do seu problema de saúde, como, aliás, se deduz pelo teor da legenda que escreveu, no dia 28 de Abril (ver aqui): “Um grande e caloroso abraço a um grande sportinguista (e amigo!), a passar por momentos difíceis e a lutar pela vida! Força Manolo, que tens alma e garra de leão!!!”
De resto, ao reagir a críticas de internautas, o João Franklin Gonçalves dá a sua versão: “A foto (tirada com o seu consentimento!) pretende ser uma expressão de solidariedade humana e nada mais do que isso! Que fique bem claro que não houve qualquer "invasão de privacidade"”, considera o médico, num dos comentários que publicou no seu Facebook, que está acessível a todo o público. E o cirurgião remata o assunto desta forma: “Quem me conhece, sabe bem que eu nunca faria algo que pudesse afectar a privacidade ou bem-estar das pessoas ou doentes... End of story!!!” Muito loquente, o “senhor doutor”.
O caso está a provocar desagrado junto da comunidade sportinguista e de alguns amigos e subscritores do médico no Facebook. “Uma invasão da privacidade inqualificável”, considera Pedro Hélder Maia, acrescentando, referindo-se ao médico: “Embora não duvide das suas boas intenções, você devia pensar duas vezes e ter mais respeito pela pessoa que está a tratar.” O jornalista André Figueiredo, por seu turno, considera que “o senhor Manolo Vidal está fragilizado e não devia ser exposto desta forma”.
Mas há outra questão sensível além do direito que o doente tem à preservação da sua imagem. É que um médico, tal como um advogado, tem obrigações de sigilo profissional. Se um advogado não conta o crime que o seu cliente cometeu, um médico não pode mostrar um doente publicamente – seja conhecido ou anónimo. “Se os médicos desatarem a publicar doentes no Facebook, está o caminho aberto para a violação de direitos fundamentais”, adverte, por seu lado, o advogado António Gouveia Ferreira, de Vila Nova de Famalicão, que pergunta: “Onde fica o limite?”Mas há quem não dê importância ao caso: “Não me choca a foto. Se fosse publicada num jornal, podia levantar muitas questões, mas ao que parece foi no próprio mural do médico”, afirma a jornalista Rita Vaz da Silva. A questão é que uma foto publicada no Facebook até pode ser propagada muito mais facilmente do que através de um jornal impresso. Como foi, aliás, o caso da imagem de Manolo Vidal na cama do hospital.
Eis mais um problema suscitado pelos novos meios de comunicação digital, que partilho com os leitores do blogue COMUNICAÇÃO INTEGRADA. Um problema a convocar a atenção de todos os cidadãos sobre o seu comportamento na Internet e a demonstrar que as autoridades públicas governamentais deveriam apostar na educação mediática de toda a população – não só das crianças e jovens, mas também de adultos activos e idosos.

Obs. – Na imagem em cima, Manolo Vidal é o primeiro a contar da esquerda. A imagem é de 2001-2002, último ano em que o Sporting foi campeão nacional, com o treinador Lazlo Bolöni.

segunda-feira, 12 de março de 2012

O delegado da Liga de futebol que abriu a boca no Facebook


Para muita gente, ter acesso às novas tecnologias de difusão de informação é como dar um salto maior do que a perna. É o caso daquelas pessoas que ocupam funções que exigem independência pública à prova de bala, mas depois vão para o Facebook emitir as suas opiniões pessoais como quem está no café a conversar com os amigos mais chegados. Foi o que aconteceu a um delegado da Liga Portuguesa de Futebol Profissional, um adepto confesso do FC Porto, e um dos delegados mais antigos, que usou a sua conta pessoal no Facebook para falar de modo grosseiro sobre a arbitragem do jogo Paços de Ferreira-Benfica (ver conteúdo na imagem).
Acresce que uma das funções de um delegado da Liga é fomentar o "fair play" (ver aqui, no artigo 39º). Ora, o delegado Manuel Armindo até pode ter a maior razão do mundo, mas não pode expressar-se daquela maneira numa rede social. Nem deve emitir a sua opinião pessoal publicamente. Porque dar opiniões no Facebook não é a mesma coisa que dar opiniões dentro de casa, em família ou com os amigos. Na prática, é o mesmo que emitir opiniões num jornal.
Como já escrevi neste blogue (ver aqui), a linha que divide a esfera pública da esfera privada tem sido alterada ao longo dos tempos. E tem sido motivo de muitos debates. E, com a Internet e a explosão das redes sociais, a confusão entre o que é público e o que é privado tornou-se cada vez mais evidente.
Neste caso concreto – que valeu para ficarmos a saber, de modo cristalino, o nível dos observadores da Liga, cuja função é garantir que tudo decorra bem na organização de um jogo de futebol –, as opiniões do cidadão Manuel Armindo sobre a arbitragem do Paços de Ferreira-Benfica, assim como a forma grosseira como se referiu ao presidente do Benfica, Luís Filipe Vieira, comprometem, evidentemente, o delegado da Liga Manuel Armindo. Por isso, a Liga suspendeu o seu delegado (ver aqui). Veremos o que vai acontecer.

terça-feira, 24 de janeiro de 2012

Cavaco Silva. O declínio do homem público


Na década de 1970, o sociólogo e historiador norte-americano Richard Sennet escreveu “O Declínio do Homem Público - As Tiranias da Intimidade”, uma obra clássica da sociologia contemporânea, que percorre uma das questões mais polémicas do nosso tempo: a relação difícil entre o domínio público e o privado. Preocupado com o esvaziamento do espaço público, Richard Sennett pretende mostrar que a derrocada da vida pública – mediante uma prática social cada vez mais intimista –, resulta de uma mudança que começou na era Moderna, com a formação de uma nova cultura urbana e capitalista.
Sennet faz uma caracterização precisa e extremamente contemporânea do problema público, do que é o domínio público, e das inúmeras mudanças ocorridas nele, em especial em relação à intrusão dos sentimentos e ao exercício de uma cultura da personalidade, que subverte as relações sociais e que até modifica o sentido do que é o amor e a sexualidade para as pessoas. O objectivo é detectar os motivos que ocasionaram o surgimento de um espaço público morto. Nesse sentido, Sennett afirma que “foi a geração nascida após a Segunda Guerra Mundial que se voltou para dentro de si ao libertar-se das repressões sexuais”, tendo sido “nessa mesma geração que se operou a maior parte da destruição física do domínio público”, observa o autor.
Vem isto a propósito da trapalhada em que se meteu o Presidente da República Portuguesa, Cavaco Silva, ao falar em público sobre um assunto de natureza privada: as suas pensões de reforma.
Com o declínio do Estado, que acontece todos os dias, cai também o homem público. E os problemas tendem a ser privados em maior número. Ora, Cavaco Silva deveria saber que neste mundo do narcisismo desvairado e da competição desenfreada, a privatização da existência assumiu proporções tais que o “eu” invade constantemente o já tão depauperado espaço do outro. E em Portugal, viver é cada vez mais difícil. Que o digam milhares e milhares de portugueses que são atirados para o desemprego ou que sobrevivem com reformas miseráveis, enquanto a saúde é cada vez mais cara, a energia é cada vez mais cara, tudo é cada vez mais caro.
O tropeção verbal de Cavaco Silva – curiosamente um grande defensor das políticas públicas e dos sectores mais pobres da sociedade, que sempre admirei – representa, assim, o declínio do homem público português. Que, à falta de uma ideia de Portugal que seja mobilizadora para o futuro, se perde à frente dos microfones – onde a pressão é muito maior do que quando se comunica através do Facebook... – a falar da sua sobrevivência pessoal de um modo absolutamente insensato, tendo em conta o rendimento da maioria dos cidadãos portugueses.
Cavaco quis colocar-se no lugar de outros portugueses como ele, que agora viram frustradas expectativas financeiras que legitimamente alimentaram ao longo da vida activa. O problema é que enquanto alguns ainda podem ver os seus rendimentos reduzidos que nunca passarão fome, a grande maioria já não poderá dizer o mesmo. Além disso, o Presidente não é um português qualquer, pois nem sequer precisa de fazer contas para viver para além de Belém. Porque nós até lhe pagamos tudo.
Por isso, as suas palavras foram muito mal recebidas, manchando fortemente a sua imagem pública mediática. Basta lembrar as vaias do povo em Guimarães – que significaram um prolongamento real das fotomontagens e dos comentários que povoam o Facebook e outras redes sociais, onde Cavaco Silva também comunica –, ou, principalmente, ouvir em privado o que dizem eleitores e dirigentes da sua base política de apoio para perceber a dimensão do desastre comunicacional.

quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

"Big Brother Brasil". Escândalo sexual ameaça Fiat


O que é que uma marca deve fazer quando patrocina um programa de televisão de grande audiência que se transforma num caso de polícia? Deve suspender o patrocínio ou aproveitar a exposição decorrente da polémica? E os valores da marca, onde ficam?...
No Brasil, começou há dias mais uma série do programa “Big Brother”, actualmente na 12ª edição, na Rede Globo, que já virou caso de polícia, por suspeitas de um acto de violação sexual registado pelas câmaras em directo, após os concorrentes terem sido regados com muito álcool. O caso, que está a ser investigado pelas autoridades, rebentou nas redes sociais, nomeadamente no Twitter, e tornou-se incontrolável em muito pouco tempo, depois de as imagens da suposta violação terem passado no canal de assinatura. (Ver aqui)
A Fiat, grande patrocinadora do programa, distribuindo carros entre os participantes e a audiência, enfrenta agora ameaças de boicote por parte do público. Uma situação de crise pouco comum, que escapa ao controlo dos responsáveis de comunicação da Fiat e de outros patrocinadores do programa, mas que pode acontecer em qualquer campanha publicitária, sobretudo quando estamos a falar do patrocínio de um programa em directo e de natureza imprevisível. São os pressupostos exteriores à organização, ou seja, que não dependem de nós, dos quais depende o sucesso de uma acção de comunicação.
Perante este caso, e em função da reacção do público, a Fiat pode, no limite, ser obrigada colocar em causa a continuidade do patrocínio se essa decisão constituir um mal menor. A questão será avaliar se o investimento no programa terá o esperado retorno positivo no mercado ou um inesperado retorno negativo, como consequência do escândalo sexual. A Fiat e outras marcas muito conhecidas estão a ser criticadas por "patrocinarem baixaria", agora transformada em caso policial. "É inacreditável o facto de empresas importantes a exemplo da Nestlé, Fiat, Omo e Guaraná Antártica patrocinarem o repugnante Big Brother Brasil, um dos maiores despropósitos já surgidos na história da televisão brasileira", considera a radialista Rosilene Carvalho (ver aqui). Eis um caso interessante de comunicação publicitária para acompanhar com atenção.
Quanto ao Big Brohter, não deixa de continuar fiel ao formato que já conhecemos, nomeadamente em Portugal, apresentando-se, na definição do jornalista brasileiro Washington Araújo, como “um dos programas mais fúteis entre a enormidade de produção de lixo televisivo” que povoa o espaço mediático. Afinal, a ideia básica dessa espécie de programa é “vender cabeças vazias em corpos sarados e uma série quase interminável de comportamentos humanos aceitáveis na esfera privada e patéticos quando transbordam para a esfera pública”. Ver aqui.

sexta-feira, 2 de setembro de 2011

O escândalo das escutas e a decadência europeia

Os serviços secretos portugueses espiam jornalistas. Agora também sabemos que em França acontece o mesmo. No fundo, isto significa que Portugal e França estão no “pelotão da frente” da decadência europeia, para citar uma expressão que, em tempos que já lá vão, Cavaco Silva gostava muito de proferir.
As notícias do "Expresso" deste fim-de-semana, que dão conta de mais escutas ilegais, desta vez por motivos particulares, envolvendo o ex-marido da mulher de um "quadro" da Ongoing, ilustram bem a podridão que se instalou nos serviços de informações do Estado português. A dimensão do escândalo parece não ter limites.

terça-feira, 23 de agosto de 2011

Hugo Chávez e a doença dos políticos


A doença de um político em funções governativas pertence à esfera privada desse político ou é assunto da esfera pública que deva ser do conhecimento de todos? A questão é polémica.
Considero que a doença de um político só deve pertencer à esfera pública, isto é, só deve ser conhecida do público, quando é susceptível de influenciar as suas decisões políticas. Um político que sofra de cancro, por exemplo, se decidir continuar em funções após ter-lhe sido diagnosticada a doença, deve dar a conhecer publicamente o seu estado de saúde. Foi o que fez, e bem, Hugo Chávez, líder do Governo da Venezuela. Foi também o que fez Dilma Roussef (para mencionar um caso geográfica e culturalmente próximo), em 2009, a um ano da campanha eleitoral, quando era ministra da Casa Civil e candidata à sucessão de Lula da Silva na Presidência do Brasil e lutou, com transparência mas com discrição, contra um cancro linfático.
O bom senso é fundamental. A doença pode tornar-se pública mas não deve tornar-se do público. Há certos limites que não devem ser ultrapassados. Na Venezuela, de tanto falar na doença, sempre que aparece em público, Chávez já envolveu o povo na sua luta pessoal contra a doença, criando uma onda de solidariedade nunca vista. Chávez ficou sem cabelo na sequência das dolorosas sessões de quimioterapia e os venezuelanos começaram a rapar o cabelo em solidariedade com o presidente do Governo.
Podemos, por isso, imaginar todos os governantes e todos os funcionários públicos do país de cabeça rapada, solidários com o grande líder, mesmo que não gostem do corte e que, no fundo, no fundo, nem estejam solidários. É a força da imagem e da simbologia.
Como manobra de comunicação parece estar ao nível de uma telenovela realizada na própria Venezuela – país que, curiosamente, terá eleições para o Governo em 2012, pelo que a oposição veio a público acusar Chávez de utilizar a doença para colher dividendos políticos. Com o acto eleitoral no horizonte, Hugo Chávez conseguiu transformar o corte de cabelo num símbolo político capaz de dividir o país: de um lado estão cabeças rapadas, que serão prò-Chávez, enquanto do outro estão os do cabelo crescido, que serão anti-Chávez.