domingo, 27 de maio de 2012

O "Jornal de Notícias" e a doação de órgãos

Na sua edição deste domingo, dia 27, o “Jornal de Notícias” revela que a família de uma jovem estudante da Universidade do Minho, que morreu no hospital dias depois de ter sido atropelada, decidiu doar os órgãos da vítima. A notícia começa mesmo por dizer que a família da estudante “deu indicações à equipa clínica” para que "recolha todos os órgãos passíveis de serem doados".
Eis um exemplo flagrante de uma notícia falsa, ou de uma não-notícia, que um jornal popular apresenta como sendo uma grande notícia, aliás, com título na sua primeira página e grande destaque na edição online (ver aqui).
A questão é que a lei portuguesa pressupõe que todos os cidadãos adultos sejam dadores de órgãos, a não ser que se inscrevam como não-dadores no Registo Nacional de Não Dadores (RENNDA), disponível em todos os centros de saúde. Portanto, nenhuma família dá indicações a uma equipa médica para que os órgãos de um familiar que tenha morrido sejam doados. É uma questão do foro individual, regulada pela legislação. A família apenas recebe a informação de que os órgãos serão doados, caso isso aconteça.
Por isso, não é de admirar que as tiragens e as vendas dos jornais continuem a descer. E não adianta culpabilizar a Internet e as suas notícias gratuitas pelos males do mundo. O problema reside, em grande escala, em cada jornalista e em cada jornal. Com os erros grosseiros que se praticam todos os dias, o que é surpreendente é que haja jornais que resistam a tanta falta de rigor.
Infelizmente, a tendência de descida das vendas de jornais vai continuar.Porque os leitores são consumidores cada vez mais informados e cada vez mais exigentes. Por isso, cada vez mais, deixam de comprar gato por lebre.

3 comentários:

Anônimo disse...

Leu o texto? Ou ficou-se apenas pela rama? Basta ler o início....

A família da jovem aluna do 2.º ano de Ciência Política da UMinho que faleceu este sábado no Hospital de S. João, no Porto, deu indicações à equipa clínica para que "recolha todos os órgãos passíveis de serem doados". Tais indicações não seriam necessárias, por a lei determinar a doação compulsiva de órgãos de cidadãos adultos caso o putativo doador não tenha deixado instruções em contrário - inscrevendo-se como não-dador no Registo Nacional de Não Dadores.
A família enlutada pretendeu vincar uma atitude que seria, em função da atividade cívica da estudante universitária, a vontade de Juliana em qualquer circunstância.

"A vida e a morte não podem ser em vão. Queremos que sejam salvas outras vidas ou, pelo menos, que outras pessoas possam ter vida melhor", disse ao JN fonte familiar.

"Para que fossem realizados todos os procedimentos necessários à recolha dos órgãos, os pais da jovem de Famalicão, que era filha única, já não se deslocaram ao Porto no sábado, e só segunda-feira é que o corpo de Juliana Salazar do Amaral Fernandes chegará a Famalicão.

A mesma fonte salientou que "nenhuma máquina foi desligada", apesar de já existir "morte cerebral "desde o início da semana. "O corpo já não reagia a qualquer medicamento. Não havia nada a fazer. O coração parou quando teve de parar", disse.

Luís Paulo Rodrigues disse...

Caro ANÓNIMO/ANÓNIMA:
O meu post foi publicado neste blogue às 10h36. O texto da edição online do JN foi actualizado já depois das 13h00. De resto, basta consultar a edição do JN em papel e comparar os textos. Muito obrigado.

Cátia Veloso disse...

Este caso teve outros contornos muito "obscuros" no que respeita à cobertura jornalística.

Refiro-me à forma como os media publicaram e depois desmentiram a morte da aluna na quinta-feira passada.

Por exemplo, no Ptjornal, no link http://www.ptjornal.com/201205248131/geral/sociedade/confirmada-morte-de-uma-das-universitarias-atropeladas-em-braga.html, foi "confirmada" a morte da jovem, mas no final da notícia (onde, por acaso aprendi na faculdade, é o local onde se coloca os pormenores de menor relevo) surge uma atualização em que desmente a morte. Pergunto: essa atualização não deveria obrigar à mudança do título e à forma como começava a notícia, para reparar o erro de publicar um facto não confirmado?