segunda-feira, 8 de agosto de 2011

Joaquim Vieira e a privatização da RTP


"Em toda a União Europeia, exceto no Luxemburgo (511 mil habitantes) e Malta (413 mil), o serviço público de televisão é assegurado através de pelo menos dois canais, e muitas vezes três (ou até mais). A lógica é que, devendo o serviço público dirigir-se naturalmente a toda a população, esta possui gostos e interesses distintos a que é impossível corresponder apenas com um canal. Não existe um público de televisão, mas diversos públicos – para simplificar, haverá, “grosso modo”, dois grandes grupos: a elite e a massa. Daí a necessidade da existência de um mínimo de dois canais, por norma o primeiro, de conteúdos mais populares (dirigido à massa), e o segundo, com programação mais sofisticada (para a elite). Apesar do debate que tem havido a nível europeu acerca desta matéria, nunca foi admitida a possibilidade de reunir tudo num único canal, que seria um canal esquizofrénico, querendo agradar a todas as camadas e acabando por não agradar a nenhuma. Fazer um só canal de televisão pública tenderia a afastar sobretudo as camadas populares, dado que esse canal teria necessariamente o nível de programação mais exigente que por hábito, numa perspetiva fundamentalista, se associa ao conceito de serviço público (patente, aliás, na ideia do PSD de privatizar a RTP1, mas deixar a RTP2 na área pública). Ou seja, todos os contribuintes passariam a pagar um canal que apenas um grupo restrito sintonizaria. Seria a mesma lógica das SCUT: todos as pagam, mas só as utilizam os poucos que nelas circulam. A médio prazo, sobrelevaria a pressão para fechar também esse canal, por inadequação aos consumos públicos de TV, e assim extinguir de vez a televisão pública (que tem uma função supletiva em relação às estações privadas). Sou, por isso, contra a privatização da RTP1. Acho, porém, útil que se discuta se o tipo de programação da RTP1 (e da RTP2) é o mais adequado, se se justifica o seu orçamento anual e também quais as melhores formas de financiamento do serviço público de TV em Portugal. E vale ainda a pena perguntar se se justificam os canais da RTP no cabo, onde o acesso dos telespetadores não é universal, ou se a sua programação não poderia ser 'diluída' na RTP1, na RTP2 e na Internet."

Joaquim Vieira, jornalista, na sua página no Facebook, 08-08-2011

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