O "Diário do Minho" é o únicio diário católico. É lido nos distritos de Braga e Viana do Castelo, mas o seu público está concentrado na cidade bracarense
A Igreja tem uma presença esmagadora na imprensa regional, mas os jornais estão envelhecidos e sobrevivem com anúncios institucionais e de necrologia. Quer se goste quer não, a história da imprensa regional portuguesa é feita da imprensa de inspiração cristã. E quer se goste quer não, boa parte dos jornais regionais ainda pertencem à Igreja. Existem em todos os distritos e na maioria têm audiências elevadas. Em 2008, o "Anuário Católico" dava conta de que a Igreja detinha cerca de 800 títulos – entre jornais, revistas e boletins paroquiais. Semanários de expansão regional existem 17, espalhados pelo País: é o sonho de qualquer grupo de “media”.
Alexandre Manuel, jornalista e professor universitário, quis estudar o fenómeno e passou a pente fino as principais publicações da Igreja. O resultado é uma tese de doutoramento apresentada no ISCTE – Instituto Universitário de Lisboa. "Da imprensa regional da Igreja Católica: para uma análise sociológica" deverá, em breve, ser editada em livro. As conclusões são um verdadeiro raio X aos semanários regionais da Igreja – que em alguns distritos são líderes de audiência ou desempenham o papel de único jornal generalista.
Os semanários da Igreja, concluiu o investigador, são quase todos (cerca de 90%) dirigidos ou administrados por padres – em alguns casos, os sacerdotes chegam mesmo a acumular as duas funções. As redacções até são constituídas por profissionais com um nível escolar acima da média (mais de 60% têm curso superior ou equivalente) e 75% dos jornalistas e colaboradores são homens. "Existe uma percentagem de mulheres bastante inferior às 40% que em Portugal têm carteira profissional de jornalista", diz o autor. Um terço dos profissionais já têm mais de 50 anos e 25% menos de 30. Quase todos, 80%, têm carteira profissional de jornalista.
Outra característica da imprensa regional católica que facilmente salta à vista são os baixos salários pagos aos profissionais. "Quarenta e oito por cento dos salários oscilam entre os 500 e os 750 euros mensais", refere Alexandre Manuel. Cerca de 20% recebem mesmo menos de 500 euros.
De acordo com a análise apresentada no ISCTE, marketing é uma palavra que a Igreja desconhece. A maioria dos jornais "não tem qualquer profissional nas áreas comercial e do marketing". De onde vem a publicidade então? São sobretudo pequenos anúncios classificados e de necrologia, além de muita publicidade institucional: convocatórias, editais, publicações judiciais. O preço médio por página ronda os 580 euros. A ausência de investimento no marketing pode ser explicada, acredita o investigador, pelo facto de mais de 80% das vendas dos jornais serem feitas por assinatura – só 14% são vendidos em banca.
Se deter uma rede de jornais em todo o país é a ambição de qualquer grande grupo de “media”, a verdade é que a Igreja não parece determinada a apostar nas sinergias. "Os responsáveis permanecem indiferentes à dispersão de títulos e não há uma estratégia comum, porque cada jornal obedece, com maior ou menor reverência, à sua diocese", explica Alexandre Manuel. Isto apesar de a Igreja até deter uma agência de informação – a Ecclesia.
Outra preocupação inexistente é o “design”. "Não há cuidado com a imagem e por vezes os textos são ilegíveis", constatou o autor. A título de exemplo, 60% das fotografias são publicadas sem qualquer legenda. Os próprios “leads” das notícias "não são fortes nem incisivos". De resto, e apesar de pertencerem à Igreja, nem todos os jornais dão o mesmo espaço às questões religiosas. Há publicações, especialmente as de maior tiragem, que só reservam entre 2% a 5% do seu espaço aos temas da Igreja – por norma tratados nos espaços de opinião, que podiam ser melhorados: "Além de descontextualizados da actualidade, os artigos de opinião utilizam uma linguagem repetitiva e moralista, confundindo o discurso do altar com o discurso dos media", refere a tese. Em suma, falta alguma "profissionalização" nos jornais e não são raros os casos em que uma única pessoa é "simultaneamente director, jornalista, fotógrafo e gráfico".
E quem é o público dos jornais da Igreja? Quase metade dos leitores tem mais de 65 anos – o que revela um envelhecimento da audiência. Além disso, 74% de quem os lê admite participar "muitas vezes" em cerimónias religiosas.
Tiradas as conclusões, Alexandre Manuel acredita que, face às dificuldades e desafios que se apresentam à imprensa em geral, são precisas mudanças na imprensa da Igreja, sob pena de alguns títulos virem a desaparecer. "É preciso maior abertura aos leigos, que poderiam assumir responsabilidades nos jornais; criar uma rede de sinergias; apostar no marketing e acabar com o amadorismo, apostando no profissionalismo e no ‘design’", resume.
FONTE: Rosa Ramos, jornal “i”, 03-09-2011
Nenhum comentário:
Postar um comentário