“Pensava-se que a Internet iria remodelar o mundo, mas o mundo acabou por fazer o contrário. Acho que foi o mundo a ter mais impacto na Internet que o contrário.”
“Talvez a palavra “flop” seja demasiado forte para caracterizar o impacto que a Internet acabou por ter no mundo. As expectativas não foram cumpridas, mas o activismo político, por exemplo, ficou muito mais forte com a Internet. Qualquer grupo que se reúna para combater algo que o preocupe tem na Internet o melhor difusor da mensagem. E muitos têm conseguido marcar a agenda mundial, há vários exemplos. Veja-se a denúncia das fábricas da Apple na China, onde são pagos ordenados miseráveis e os trabalhadores têm falta de condições de trabalho. À custa dos vários protestos na Internet, a Apple já tomou medidas para tentar reverter a situação. A influência da Internet é enorme, é uma das grandes consequências. Com a Internet os activistas conseguem trazer mais activistas para a rua. E a Internet teve grande impacto na movimentação dos capitais. Apesar de tudo, o mundo não ficou melhor com a Internet, não da forma que se imaginava há 15 ou 20 anos.”
“Os grandes excluídos são os que não têm acesso à Internet. Apenas 30% da população mundial tem acesso fácil e os 70% que não o têm são de países pobres. Isso quer dizer que as principais mudanças provocadas pela Internet ocorreram nos países ricos. E há outro aspecto: a Internet promove o activismo, mas o activismo acaba por ficar limitado aos mais ricos. Se formos um cidadão pobre a viver numa sociedade rica e ocidental, vivemos uma experiência dolorosa de exclusão, quase pior que viver num país totalmente pobre, devido à componente moral da pobreza, em que as pessoas são culpadas da sua pobreza, por falharem o êxito pessoal e material. Isso aumenta a exclusão do activismo político, por as pessoas estarem mais desmoralizadas e afastadas da acção. Há vários factores no mundo real que desencorajam as famílias mais pobres de serem mais activas em termos políticos. E tal facto projecta uma enorme sombra sobre o alcance da Internet. O ciberespaço não deu mais poder às pessoas, de forma global.”
“Outra das desilusões dos que, nos anos 90, tinham grandes expectativas quanto à Internet e à liberdade da circulação da informação, que estaria fora do alcance dos estados, é que os governos andam cada vez mais a vigiar a Internet. Organizações como a Wikileaks e a Anonymous tentam reverter essa tendência de supra-vigilância estatal sobre o cidadão comum. Estes movimentos tentam manter vivo o espírito inicial da Internet, de quando se acreditava que ela iria derrubar ditadores e seria uma ferramenta da liberdade de expressão.”“A penetração da Internet na Arábia Saudita, em Marrocos ou nos Emirados Árabes Unidos (EAU), por exemplo, é bem maior que na Tunísia, na Líbia ou no Egipto. Mas os sauditas ou os marroquinos não fizeram a Primavera Árabe. Nem os habitantes dos Emirados àrabes Unidos. Isso mostra que a tecnologia não faz revoluções. Foram outras as razões que levaram à Primavera Árabe, como o desemprego, as falhas no sector da educação, as rivalidades tribais, o sistema económico, etc. E houve sinais que mostraram que a Primavera Árabe ia acontecer. Os jornalistas ocidentais caíram na tentação de olhar para esta revolução como fruto da Internet e do seu poder. Mas é claro que a Internet acabou por dar alguma força à questão, mostrando ao mundo rico o que se estava a passar por lá.”
“Muitos dos chamados ‘egovernos’ apenas disponibilizam informação para consulta, sem grande comunicação entre governantes e governados. É um mero pró-forma por parte das entidades estatais, para deixar os cidadãos satisfeitos. A maior parte das vezes são meras acções de relações públicas.”
“Acho que [o jornalismo] está a ficar pior. A Internet está a afastar o investimento publicitário dos chamados meios tradicionais, levando a que menos jornalistas tenham de produzir mais conteúdos e baixando a qualidade. E quanto ao mito do jornalista-cidadão, é uma forma de jornalismo que não tem um modelo de viabilidade muito definido. De resto, a Internet está a pulverizar o jornalismo.”
James Curran, director do Goldsmith Media Research Centre, jornal “i”, 06-03-2012 (ver aqui documento integral)
Um comentário:
Mas o jornalismo se pulvarizou a si proprio com os fracos jornalistas que tem actualmente, por isso nada de estranho nisto, uma vez que se escreve melhor na internet por pessoas que nao sao jornalistas, alguns com pouco estudos que esses diplomados de meia tijela que so bajulam seus donos.
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